22 de janeiro de 2017

MicroEnsaioPoético: Carlito Azevedo

Mais uma brincação ensaio-poemática do projeto-ideia MicroEnsaioPoético, agora com o poeta Carlito Azevedo. A postagem original está no meu Instagram, disponível em:  www.instagram.com/fabiospessanha



MicroEnsaioPoético – Carlito Azevedo

Sim,
a rua encoberta, os verões vermelhos, transeuntes de dentro dos passos. Luas são colhidas, acolhidas; chegam, deslizam, arredondam o contorno dos riscos largados no chão.
Sim,
desde antes da terra, o ainda absoluto são seus pés. A confissão dessas trilhas passa entre joelhos e tornozelos. A busca pelo vento que redescobre as faces guarnecidas entre cabelos e esguichos de olhar. Escorrega, recobra a falta das linhas, estas que deixaram de ser retas, estas que fincam cruzadas, estas que são estradas.
Sim,
corre atrás do vento, agiganta, envermelha a devoção por estios, rabisca de passadiço a lembrança que te toma, que te oferece alheia, que te retarda saltos, que te pula e cai. Que te fica aqui... nos verões daqui.

Fábio Santana Pessanha

Referência do poema

AZEVEDO, Carlito. Monodrama. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p. 94.

17 de janeiro de 2017

MicroEnsaioPoético... ideias entre poemas e palavras

Nesses rumos de invenções, a palavra ganha gestos virtuais, virais, vindo ao punho da garganta quando sobressalta língua e palavra na costura de seus veios. Então, perambulando por essas hipóteses poéticas, outra ideia surgiu... e são saliências de conversas com outros poetas, com poemas, com escritos diversos. Nasce, assim, o projeto-ideia MicroEnsaioPoético, o qual será um certeiro ataque no estômago palavral do poema. Mas não nessa virulência gratuita, e sim na efervescência intuita de se fazer ampliações, de pegar no calcanhar de um verso e me alargar com ele.
O ambiente inicial é o Instagram, lugarzinho que tenho testado ideias... mas ele não é o cume, tampouco o fim, quem sabe, um limite, já que tensão é o que nos é. Começou hoje lá no meu insta (www.instagram.com/fabiospessanha) e o desejo é que se prolongue... Então, abaixo, um abraço já começado com Fabrício Carpinejar...



MicroEnsaioPoético: CARPINEJAR

Irrompido na boca que me excede, a sua, a minha, a saliva que recobre desejos habita uma fatalidade: o tempo.
É manhã. O antes de qualquer presságio é inaugurado quando lábios e suor se traduzem na pertença ambígua entre corpos. É meu corpo, um corpo, que se verte em sal e trilhas líquidas. Um corpo, meu, seu, um corpo que principia mar na trajetória desse esperado destino: seu beijo.

Fábio Santana Pessanha

Referência do poema:

CARPINEJAR, Fabrício. Amor à moda antiga. Caxias do Sul, RS: Belas-Letras, 2016, p. 29.

Mais diálogos poéticos nos caminhos do pensamento

... sobre o livro que coorganizei em 2011, o Poética e Diálogo: Caminhos de Pensamento, estava pensando nele, fiz uma postagem no Instagram (https://www.instagram.com/fabiospessanha/) e quis trazê-lo pra cá também. Nele, no livro, publiquei o ensaio “A ciranda da poesia: palavra: corpo: homem: poeta”. Coisa de transversões verbo-poético-gramaticais...


E para ficar legal, segue uma provinha do que escrevi:

A fala do poeta é sempre um salto no desconhecido, um arroubo de conjecturas, estando repletas do que ainda não se disse, porque tudo que se diz é dito pela primeira vez, obviamente, tendo as palavras sua articulação com o mistério do inapreensível. Quando o poeta acolhe o inesperado em seu dizer, está se reinventando na linguagem, fazendo-se mar, deitando seu corpo no imprevisto chão que o adentra e faz declive de trilhas e caminhos num misto de árvore e pele. Esse é o mais perto que se pode chegar de um dizer poético, ou seja, deixando a poesia vir e tomar seu lugar no corpo, sendo corpo e se fazendo realização da linguagem. Tal disponibilidade significa deixar-se possuir pelo poético em vez de se tentar agonicamente agarrar a palavra, impondo a rudeza de carceragens significativas à leveza de seu voo. (p. 236)

O pensar poético... repensando a gramática...

Em 2013 recebi um convite: “E se você escrevesse sobre gramática a partir do poético?”. Aceitei. Então, em 2014 saiu esse livrinho, e nele vem meu ensaio “Agramática: a desgramaticalização a partir do poético”.


Partilho aqui um trechinho do meu texto:

Cada canto do idioma é uma veste gramatical, cada cor com seu tom, cada pronúncia com a minúcia de um carrossel léxico por onde passam sonatas de sagração da linguagem. Sonatas são vestígios sonoros de corpos musicais, cuja fala se dá na comunhão entre harmonia e melodia de cordas em excelência canora. E assim se arremetem os enleios entre atrito e vazio: escrita. Tudo que se escreve, escreve-se a partir de um instante, instante este que já se foi e ao mesmo tempo será sempre póstero em sua própria reinvenção. O que aqui se diz se impregna de ventura e de passagem, pois se trilha um caminho inesperado. A (des)gramática, quando digo que só existe aqui, não digo por presunção, e sim por assunção de algo que se instala à medida de singular consumação. A força que ora vige tem sua morada no poético. Eis o único modo, o mais digno e sincero, de se palavrar em verbo o aceno da poesia no berço, na originariedade, de sua imanência, de sua permanência enquanto o sempre-a-ser-dito de um acontecer, do não dito de qualquer dizer. É nesse sentido que afirmo empreender aqui uma desgramática, uma gramática legítima da instabilidade do tempo, da imprevisibilidade do porvir. (pp. 210-11)


Referência 

PESSANHA, Fábio Santana. “Agramática: a desgramaticalização a partir do poético”. In: CASTRO, Manuel Antônio; FAGUNDES, Igor; FERRAZ, Antônio Máximo (orgs.). O educar poético. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2014.