18 de agosto de 2014

O Educar Poético

Mais um lançamento da Editora Tempo Brasileiro chega a público! Refiro-me ao livro O Educar Poético, organizado pelos professores Manuel Antônio de Castro (UFRJ), Igor Fagundes (UFRJ) e Antônio Máximo Ferraz (UFPA). Com o foco na Educação Poética, onde “Poética” não se resume a um simples adjetivo, neste livro vemos o despir-se do lugar-comum das teorias pedagógicas para o salto no abraço do mistério que reúne o “princípio e o sentido de todas as falas, de todas as escutas”[1] a partir da ação originária do poético; ação esta que aponta, sinaliza, o humano como “parte do mistério de ser”.[2]



Cogitando o educar a partir do poético, com vistas à fertilização de possíveis modos de percepção do sentido de educar, pensou-se numa reunião de diversos olhares para a composição dos textos que se enlaçam nesta obra:

Os professores, os artistas, os pensadores que aqui se reúnem em livro partem de tal horizonte: encontram-se lançados no livre-aberto, conduzidos pelo aberto, perfazendo a existência como esta poética educação. Antes verbo do que substantivo, antes ação (questão!) do que definição (conceito!), educar será toda palavra, corpo, rosto, sentido, destino que se reconheça mistério. Em liberdade.[3]

Contudo nenhuma formulação é criada, nenhum emblema é cunhando para fins de aplicabilidade teórica do que seja a educação. Não há receitas para professores ou profissionais de ensino, e sim a disposição à assunção de um vasto enigma, de um desafio a ser explorado pelo pensar, pela recondução do olhar do educador para si e, consequentemente, para o seu outro na condição de aluno:

Aos que ansiosamente aguardam uma decifração do enigma, seja o do aprender, seja o do ensinar; aos que confiam na sorte de encontrar por estes mundos de página uma nova cartilha, um novo modelo de ensino, respondemos com as peripécias e vicissitudes que atravessam o caminho meditativo das possibilidades. De cada um, intransferíveis, irrepetíveis, sempre singulares, as descobertas. Sobretudo, a descoberta do encobrimento permanente e imediato de si e das coisas todas. Em meio a esses desvelos e véus, o vir a ser mestre e o vir a ser aprendiz se alternam e se confundem nas encruzilhadas inesperadas do humano: pode ensinar apenas quem aprendeu e quem ainda aprende no instante em que ensina. E isso quer dizer: quem desaprende, aprendendo.[4]

Neste livro, participo com o ensaio “Agramática: a desgramaticalização no educar para o poético”, no qual tento pensar a gramática para além do reduzido e ceifador sentido normativo que há muito tempo nos reprime verbalmente. Se tivermos cuidadosa escuta e não nos deixarmos levar pelas retóricas vigentes do cotidiano, seja acadêmico ou das esquinas de nossas ruas, acredito que a gramática – que nos dá margens para pensarmos a agramática, conforme nos diz um poema de Manoel de Barros,[5] ou simplesmente a desgramática – é uma possibilidade de salto para o infinito do poético, quando nos valemos, melhor, nos apropriamos de nossa língua para com ela nos absurdarmos:

A gramática em sua desgramaticalização é um salto na profundidade verbal de ser tudo que se diz na vigência do não-dito. E pela pintura divina da escrita, devemos crer que o mundo se arremete em dores quando a sílaba rasga o silêncio ao acolher o grifo de uma letra. A palavra, em seu conjunto verbo-gramatical, brinca com as criações vindouras, sendo o meio de qualquer enleio, uma vez que sua ressalva é sempre pela alva ou também impura – visto que é gesto e sobressalto – de molecagens sintaticais.[6]

Que todos se sintam convidados a mergulhar nO Educar Poético, nesse desafio de repensar a si mesmos, que consequentemente aponta para a reinvenção do educar a partir do poético, crendo que inventar é o modo mais radical de estar na realidade, convivendo com as diferenças que nos formam, que nos constituem misteriosamente humanos.

Referências

CASTRO, Manuel Antônio de; FAGUNDES, Igor; FERRAZ, Antônio Máximo (orgs.). O Educar Poético. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2014.
PESSANHA, Fábio Santana. “Agramática: a desgramaticalização no educar para o poético. In: ______. O Educar Poético. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2014, pp. 199-216.





[1] Trecho do texto de apresentação do livro, p. 9. Darei a referência do livro no final da postagem.
[2] Idem.
[3] Idem, pp. 9-10.
[4] Idem, p. 10.
[5] Poeta que regerá o andamento do meu ensaio.
[6] PESSANHA, 2014, p. 210.

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