22 de junho de 2013

Tempo e poesia

Meus amigos, quero dividir com vocês o texto que escrevi para a orelha do livro A Poética do Tempo, de Angela Guida, editado pela Tempo Brasileiro. Tal livro integra a Coleção Pensamento Poético que, sob coordenação do Prof. Manuel Antônio de Castro, “[...] tem por finalidade acolher obras em que se faça presente a unidade poética de arte e pensamento. Trata-se de obras que têm como horizonte o questionar e o unir saber e ser. Dessa maneira o pensamento crítico, que as orienta e é inerente a toda obra poética e de pensamento, se inscreve no originário, onde criticar diz o vigorar da verdade da realidade em seu dar-se e retrair-se dialético-existencial.”[1]
Sem mais delongas, fiquemos abaixo com o que escrevi para a orelha de A Poética do Tempo. E aviso que o meu livro já está em processo de produção! Aguardem!!



Tempo e poesia
Fábio Santana Pessanha

O tempo poético, podemos pensá-lo como sendo rascunho de poesia, a tentativa de agarrar o pensamento no pulo. Então, como não é possível enlaçá-lo, só nos resta vivê-lo com vistas de horizonte. Como? Existindo, sendo...
O existir – como entremeio de vida e morte – é o maior desafio do homem, na medida em que este restitui sua humanidade ao imprevisto da própria existência. A tomada dessa consciência é o instante do salto, momento fulcral em que o homem decide pelo poético, e que Angela Guida soube perceber muito bem nesse livro. Aqui, estamos diante das veredas que ela traçou e que permeiam a transitividade entre o homem e si mesmo, como uma das possibilidades de o tempo se dar.
Conforme a autora comenta, o tempo não será definido, tampouco classificado por inúmeras categorias teoricizantes: quer seja o psicológico, o cronológico ou mesmo o poético. O cuidado dela em não se deixar ludibriar pela sedução do já-dito é evidente, e isso percebemos quando nos deixamos levar pelas mãos de sua fala. Pois, pelo menor descuido, o poético se tornaria apenas mais uma maneira de se classificar uma modalidade temporal.
Angela Guida dialoga ainda com a perspectiva de vários pensadores. E mais uma vez resvala no tênue limite de se pensar o tempo poético sem que o mesmo se torne mais um paradigma de delimitação temporal, como já apontamos. Daí, surgem os desdobramentos, isto é, questões que sinalizam a densidade do tempo, como esquecimento, instante, memória, tédio, finitude, moira, kairós, impermanência etc. E segundo a própria Guida: “[...] a busca pelo tempo poético, na verdade, é a busca pelo pensamento, é a busca pela clareira. E para que tal busca se dê, faz-se necessária uma ‘aprendizagem de desaprender’, a fim de que possamos nos libertar de leituras e definições fechadas que, de alguma forma, tendem a aprisionar o pensamento.”
Por ser todo trilhado pela tessitura do diálogo, sua obra nos convida ao salto. Ou seja, não temos em mãos um livro que soluciona – ou que define – o tempo poético. Ao contrário, temos o embate se dando a olhos vistos, entranhando em nossa tez o inesperado de um tempo que é sempre poético – por ser incessantemente inaugural –, convidando-nos ao exercício de sermos poesia. Como? Despindo-nos de nossas vestimentas conceituais e nos abrindo ao abraço do imprevisível: ficamos de corpo nu, sem pudor, libertos para nos abandonarmos a nós mesmos, uma vez que somos a realização do imprevisto em carne e gesto de humanidade.
Portanto, que nos enredemos por nosso próprio movimento de queda, que nos abandonemos no abismo de ser o pensamento que nos pensa, pois só assim poderemos exercer o desafio de ser, ao mesmo tempo, vida e morte em ciranda: tempo.



[1] Citação retirada do livro em questão.

8 de junho de 2013